Minha mãe me deu um rio.
Era dia de meu aniversário e ela não sabia
o que me presentear.
Fazia tempo que os mascates não passavam
naquele lugar esquecido.
Se o mascate passasse minha mãe compraria
rapadura
ou bolachinhas para me dar.
Mas como não passara o mascate, minha mãe me
deu um rio.
Era o mesmo rio que passava atrás de casa.
Eu estimei o presente mais do que fosse uma
rapadura do mascate.
Meu irmão ficou magoado porque ele gostava
do rio igual aos outros.
A mãe prometeu que no aniversário de meu
irmão
ela iria dar uma árvore para ele.
Uma que fosse coberta de pássaros.
Eu bem ouvi a promessa que a mãe fizera
ao meu irmão
e achei legal.
Os pássaros ficavam durante o dia nas margens
do meu rio
e de noite eles iriam dormir na árvore do
meu irmão.
Meu irmão me provocava assim:
a minha árvore deu lindas flores em Setembro.
E o seu rio não dá flores!
Eu respondia que a árvore dele não dava
piraputanga.
Era verdade, mas o que nos unia demais eram
os banhos nus no rio entre os pássaros.
Nesse ponto nossa vida era um afago!
Texto extraido do livro Memórias inventadas de Manoel de Barros.
Fiquei impressionada com a singela idéia criada pelo autor que inventou memórias de uma infância que não viveu. São pequenos textos que falam de sua infância, juventude e velhice, mas que ele preferiu retratar como suas três infâncias .
Fiquei encantada também com a idéia de uma mulher simples e sábia que para amenizar a pobreza de suas vidas , dá ao filho de presente o rio que passava detrás da casa.
E ele fica mais feliz do que se fossem as rapaduras do mascate.
E ao irmão promete uma árvore cheia de pássaros !
Dá pra imaginar que infância rica e inesquecível essa mulher deu aos filhos , infância que hoje muitos pais negam aos seus filhos os abarrotando de idas aos shoppings, e presentes eletrônicos que em meses se tornam ultrapassados!
Quadro: "O menino e o rio" - óleo sobre tela de Bernadeth Rocha
Um comentário:
Quero à resposta do menino que ganhou um Rio
Postar um comentário