quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Manoel de Barros




Estou apaixonada por Manoel de Barros. Talvez porque a leitura leve, mas cheia de reflexão nas coisas simples da vida , me dão a oportunidade de , por alguns momentos (seus textos são curtos) mergulhar num mundo surreal e muitas vezes ansiados por meu íntimo irriquieto. Talvez por ele ter a ousadia de brincar com as palavras, sem medo da "ignorãça" Diz que aprendeu as palavras com os pássaros, com os sapos... Vi no seu livro Memórias inventadas um retorno aos dias curiosos de minha meninice em Pilar do Sul, as tardes sem fim nos morros verdejantes de minha cidade... a criatividade ultrapassando a simplicidade imposta pela pobreza.
Encontrei em suas palavras a tinta de meus pincéis, os pontinhos delicados se unindo para formar frases abstratas.
Encontrei em sua biografia , Releituras-resumo biográfico e bibliográfico, um resumo do que é Manoel de Barros:

"Numa entrevista concedida a José Castello, do jornal "O Estado de São Paulo", em agosto de 1996, ao ser perguntado sobre qual sua rotina de poeta, respondeu:

"Exploro os mistérios irracionais dentro de uma toca que chamo 'lugar de ser inútil'. Exploro há 60 anos esses mistérios. Descubro memórias fósseis. Osso de urubu, etc. Faço escavações. Entro às 7 horas, saio ao meio-dia. Anoto coisas em pequenos cadernos de rascunho. Arrumo versos, frases, desenho bonecos. Leio a Bíblia, dicionários, às vezes percorro séculos para descobrir o primeiro esgar de uma palavra. E gosto de ouvir e ler "Vozes da Origem". Gosto de coisas que começam assim: "Antigamente, o tatu era gente e namorou a mulher de outro homem". Está no livro "Vozes da Origem", da antropóloga Betty Mindlin. Essas leituras me ajudam a explorar os mistérios irracionais. Não uso computador para escrever. Sou metido. Sempre acho que na ponta de meu lápis tem um nascimento."
...
...Não perdeu o orgulho, mas a timidez parece cada vez mais diluída. Ri de si mesmo e das glórias que não teve. "Aliás, não tenho mais nada, dei tudo para os filhos. Não sei guiar carro, vivo de mesada, sou um dependente", fala. Os rios começam a dormir pela orla, vaga-lumes driblam a treva. Meu olho ganhou dejetos, vou nascendo do meu vazio, só narro meus nascimentos."
...
"Noventa por cento do que escrevo é invenção. Só dez por cento é mentira"."

Como não se apaixonar por uma pessoa tão singela, num mundo abarrotado de narizes empinados e egos inflados?

( Agora entendi: a toca onde por vezes me escondo é o "lugar de ser inútil", de onde desenterro meus fósseis, rebuscando memórias que eu pinto.As vezes acho que passo mais tempo no passado do que no presente, remexendo baús de lembranças desbotadas e até mesmo duvidosas.
Será que estou ficando saudosista demais?)

Quadro: "Meu Mundo Perfeito- a casa em que nasci" - óleo sobre tela de Bernadeth Rocha

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